Se você não tem um parente com demência, é provável que conheça alguém que já cuidou de um familiar com Alzheimer e entende que essa experiência é bastante desafiadora. Essa é a doença neurodegenerativa mais comum na espécie humana, afetando de maneira progressiva a memória, o comportamento e outras funções cognitivas. Nos estágios mais avançados, a doença impede a pessoa de exercer suas atividades diárias, reconhecer os outros e se comunicar adequadamente.
Prevalência
A cada quatro segundos, uma pessoa é diagnosticada com demência no mundo. O número de novos casos aumenta à medida que as pessoas vivem mais. No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 33% da população com mais de 85 anos é afetada pelo Alzheimer.
As mulheres são diagnosticadas com mais frequência do que os homens, em parte porque vivem mais. Embora não existam dados consolidados no país, estima-se que atualmente haja 1,2 milhão de brasileiros com a doença. Em 2050, esse número pode chegar a 4 ou 5 milhões.
História
Em 1906, um psiquiatra alemão chamado Alois Alzheimer publicou o relato de caso de uma paciente saudável que, aos 51 anos, passou a apresentar perda progressiva de memória, alterações de comportamento, desorientação e dificuldade para se comunicar e entender o que os outros queriam dizer. Após a morte da paciente, o médico realizou uma autópsia e descobriu lesões cerebrais características.
Não é a única que gera demência
A doença que leva o nome do médico tornou-se sinônimo de demência, caracterizada pelo declínio lento e progressivo das funções cognitivas, como memória, atenção, linguagem e orientação, afetando parte das pessoas à medida que envelhecem. No entanto, o Alzheimer não é a única doença que pode levar a essa condição, embora se estime que seja responsável por 60% a 80% dos casos de demência.
As demências não são uma consequência natural do envelhecimento. Todos começam a esquecer coisas a partir de certa idade e podem demorar mais para processar informações. No entanto, muitas pessoas chegam aos 90 anos com plena lucidez e independência.
O que acontece no cérebro
Nas pessoas com Alzheimer, certas alterações tóxicas fazem com que os neurônios deixem de se comunicar e morram. Para realizar qualquer função regida pelo nosso cérebro, como pensar, falar, aprender, memorizar e planejar, entre centenas de outras, é preciso que as células nervosas os neurônios enviem sinais umas para as outras. Essa comunicação se dá por impulsos elétricos e substâncias químicas que atravessam as sinapses, pequenos espaços que existem entre as células.
Os cientistas acreditam que existem dois principais fatores por trás do processo e que envolvem duas proteínas diferentes:
Beta-amiloide: começa a se acumular e, junto com células mortas, forma depósitos entre os neurônios conhecidos como placas senis.
Tau: forma emaranhados neurofibrilares dentro das células nervosas.
Primeiros sintomas
O cérebro encolhe, literalmente, em algumas áreas. A perda de neurônios, a terceira principal característica do Alzheimer, além do acúmulo de beta-amiloide e de tau, é o que provoca isso. A primeira região afetada é o hipocampo, responsável pela memória e o aprendizado. Nossas lembranças mais importantes são consolidadas em outra parte do cérebro, e não são implicadas tão cedo. Mas a formação de novas memórias é comprometida.
Pequenos esquecimentos e falta de concentração costumam ser os primeiros sintomas para a maior parte das pessoas. Dificuldades para resolver problemas ou atividades antes apreciadas também podem se destacar no início, e podem ser interpretadas como ansiedade, desinteresse ou depressão.
10 sinais de alerta
- Problema de memória que chega a afetar as atividades e o trabalho
- Dificuldade para realizar tarefas habituais
- Dificuldade para se comunicar (as palavras às vezes “fogem”)
- Desorientação no tempo e no espaço
- Diminuição da capacidade de juízo e de crítica
- Dificuldade de raciocínio
- Colocar coisas no lugar errado, muito frequentemente
- Alterações frequentes do humor e do comportamento
- Mudanças na personalidade
- Perda de iniciativa para fazer as coisas
Evolução da doença
Com o passar do tempo, os depósitos se espalham para mais partes do cérebro. Linguagem, orientação espacial, pensamento lógico e regulação das emoções, entre outras funções mentais são afetadas.
Na fase mais avançada, há prejuízos motores. A pessoa tem dificuldade para ficar de pé, caminhar, engolir, controlar o esfíncter etc., tornando-se totalmente dependente.
O Alzheimer em si não mata, mas suas complicações podem ser fatais. É o caso da pneumonia. Dos primeiros prejuízos à memória até a fase avançada podem se passar 10 ou 15 anos.
Diferentes estágios
Os especialistas costumam dividir a doença em três: leve, moderada e avançada. Isso serve para planejar os cuidados e tratamentos. Mas, para cada paciente, os sintomas evoluem de uma maneira, por isso a descrição abaixo é apenas uma referência:
FASE LEVE
- Perda de memória leve (é possível viver com relativa independência apesar dos prejuízos)
- Dificuldades de concentração e raciocínio
- Desorientação (a pessoa pode se esquecer do caminho de casa)
- Alterações de humor e comportamento (apatia, irritabilidade, depressão, ansiedade).
FASE MODERADA
- Problemas de memória mais graves (é preciso que a pessoa tenha supervisão)
- Dificuldades de raciocínio, juízo e crítica
- Dificuldades de comunicação mais acentuadas
- Desorientação mais grave (a pessoa pode se perder mesmo dentro de casa)
- Distúrbios de sono (tendência a trocar a noite pelo dia)
- Alterações de comportamento (agitação, inquietação e às vezes agressividade)
- Alucinações e delírios podem ocorrer
FASE AVANÇADA E TERMINAL
- É necessária supervisão contínua, com auxílio a alimentação, banho, trocas etc.
- Incapacidade de se comunicar
- Dificuldades para engolir
- Perda de equilíbrio
- Dificuldades de locomoção
- Incontinência urinária e fecal
- Dificuldade para entender o que acontece ao redor
- Perda de memória grave (a pessoa deixa de reconhecer as pessoas)
- Confinamento em cama ou cadeira de rodas
Fatores de risco
Ainda não há certezas sobre as causas, mas alguns fatores parecem aumentar a predisposição ou acelerar sua evolução:
Idade: é o principal fator de risco. A partir dos 65 anos, o risco dobra a cada cinco anos. Porém, casos de Alzheimer familiar (quando vários integrantes da mesma família possuem a doença) têm início precoce, bem antes dos 50 anos.
Sexo: o diagnóstico é mais frequente entre as mulheres, provavelmente porque elas vivem mais.
Genética: alguns genes estão envolvidos no risco de Alzheimer, mas a hipótese mais aceita hoje é de que a causa é multifatorial. Embora indivíduos com histórico familiar tenham um risco mais alto de desenvolver a doença no futuro, apenas 10% de todos os casos são considerados geneticamente determinados (Alzheimer familiar). Existe teste genético para identificar mutações associadas ao risco elevado da doença (em especial o alelo E4 do gene APOE, no cromossomo 19). Mas há pessoas com essa variante que nunca desenvolvem o problema, por isso o teste só é recomendado para auxiliar no diagnóstico ou para fins de pesquisa.
Escolaridade: indivíduos com menor nível de escolaridade ou que têm poucos estímulos mentais tendem a apresentar os sintomas da doença mais cedo.
Doenças crônicas e estilo de vida: pressão alta, obesidade, sedentarismo, dieta insalubre, tabagismo, colesterol alto e diabetes, os mesmos fatores associados a infarto e derrame elevam o risco de Alzheimer e outros tipos de demência.
Traumatismos: alguns estudos (mas não todos) indicam uma relação entre o histórico de traumas no crânio e encéfalo e o risco mais alto de Alzheimer.
Estudos e mitos
Por causar tanto impacto e ainda não ter um tratamento eficaz, o Alzheimer é alvo de pesquisas em todo o mundo. Muitos desses estudos trazem novos dados sobre possíveis causas, como um trabalho recente que associou a doença à infecção por dois tipos de herpes vírus. É importante ressaltar que todas as descobertas precisam ser confirmadas por estudos mais amplos antes de serem aceitas como verdades científicas.
A Alzheimer’s Association, uma organização que reúne profissionais de diversas áreas nos EUA, esclarece que não há evidências que comprovem a associação entre a doença e panelas, latas e desodorantes com alumínio, vacinas, aspartame ou amálgama dentário.
Diagnóstico
É raro que o próprio paciente procure ajuda, ou porque não reconhece os sintomas ou por sentir vergonha deles. Como muita gente acredita que esquecimentos e mudanças de comportamento fazem parte do envelhecimento normal, não é incomum que as famílias demorem para buscar ajuda especializada de um neurologista ou geriatra.
Um diagnóstico 100% preciso só é possível após a morte, com exame detalhado do tecido cerebral. Mas os neurologistas solicitam sempre uma série de testes e exames para descartar outras possíveis causas de demência (que requerem outros tipos de tratamento), ou mesmo a sobreposição de fatores.
Podem ser solicitados exames de sangue e de imagem, como tomografia ou ressonância magnética. Também há análise do líquido cefalorraquidiano que pode detectar a presença de tau se houver perda de neurônios. Além disso, é fundamental uma avaliação neuropsicológica, não apenas para ajudar no diagnóstico, como para aferir os tipos de estimulação cognitiva que deve fazer parte do tratamento.
Comprometimento cognitivo leve ou Alzheimer?
Um quadro mais leve de perda de memória já é aceito e denominado Comprometimento Cognitivo Leve (CLL). Segundo neurologistas, é caracterizado por problemas de memória, mas sem prejuízos graves à vida do indivíduo. A distinção existe porque, ainda que o CLL possa se configurar como o estágio inicial de Alzheimer ou de outros tipos de demência, também pode ser deflagrado por outras causas, como problemas de sono, depressão, ansiedade, problemas hormonais ou metabólicos. Assim, nem todos os pacientes com esse diagnóstico têm ou vão evoluir para um quadro demencial.
Outras possíveis causas de demência
Demência vascular: provocada por pequenos derrames.
Demência com corpos de Lewy: caracterizada por alterações específicas, envolve sintomas de Parkinson, alucinações visuais e oscilação dos sintomas.
Demência por Parkinson: uma parcela dos pacientes com essa doença pode ter quadros demenciais.
Demência frontotemporal: caracterizada por uma redução das regiões frontal e temporal do cérebro, envolve alterações de comportamento, como desinibição, comentários sexuais inadequados, impulsividade, perda da capacidade de julgamento e oscilação do humor, entre outros.
Doenças que podem ter sintomas demenciais ou agravar a demência: traumas no crânio, problemas de tireoide, deficiência de vitamina B12, neurossífilis, demência relacionada ao vírus HIV, doenças causadas por príons, hematoma subdural, hidrocefalia de pressão normal, encefalite, intoxicação por metais pesados, tumores no cérebro, transtornos psiquiátricos e o uso de determinados medicamentos podem gerar sintomas parecidos com o do Alzheimer e devem ser tratados adequadamente.
Fonte: Viver Bem